100 conquista estrela Michelin
O Restaurante 100 Maneiras, do chefe Ljubomir Stanisic, conquistou ontem, dia 14 de Dezembro de 2020, a sua primeira estrela Michelin. O prémio chega ainda antes do segundo aniversário do restaurante, aberto no final de Fevereiro de 2019, mas vem reconhecer o trabalho e um percurso de mais de uma década.
“Trabalhámos muito, juntos, para ser a melhor versão possível de quem somos, seja neste ano que não é exemplo para ninguém, seja nos outros. Vejo este prémio como um reconhecimento disso mesmo: do trabalho, do afinco, do rigor, mas também da personalidade e de um percurso. O 100 Maneiras nasceu em 2004, renasceu das cinzas em 2009 e, em 2019, reinventou-se depois de quatro anos de obras e muitos revezes. Acredito que esta é a planta que semeámos, regámos e alimentámos com amor estes anos todos. Sem preconceitos, sem manias, sem medo de fazer diferente. De ser diferente”, refere o chefe Ljubomir Stanisic.
Depois da inclusão, o ano passado, na lista 50 Best Discovery (publicada pelos reputados The World’s 50 Best, um dos mais prestigiados prémios mundiais da área), a primeira estrela Michelin vem cimentar a posição do 100 Maneiras no panorama internacional e ajudar a trazer mais brilho e esperança ao final deste ano atípico.
2004 – 2020
Foi em Cascais, em 2004, que aos 26 anos Ljubomir Stanisic abriu o primeiro 100 Maneiras. Um restaurante que lhe trouxe conhecimento (e reconhecimento) e experiência. Fechado em 2008, a falência do restaurante de Cascais, profundamente diferente dos que abriria a partir de então, foi fundamental para construir a nova filosofia 100 Maneiras. Para aprender com o erro e fazer diferente. Ser diferente.
Em 2009, o primeiro 100 Maneiras em Lisboa trouxe essa diferença. Instalado no Bairro Alto, foi o primeiro espaço da capital a servir um menu degustação a um preço democrático. A partir daí, a cozinha de Ljubomir abriu-se a um público cada vez mais vasto, que privilegia o sabor, a descoberta, as experiências, mas dispensa pretensões.
Foi essa combinação de factores que, em Setembro de 2010, já com a sociedade composta pelos três membros actuais (Ljubomir Stanisic, Nelson Santos e Nuno Faria), fez nascer o Bistro 100 Maneiras. Num espaço histórico do Chiado, de inspiração Art Déco, lugar de um dos mais antigos restaurantes do país, no Bistro convivem a arte e a gastronomia, a música e a coquetelaria, os mais conservadores e os mais excêntricos, num verdadeiro hino ao prazer – reconhecido internacionalmente em 2017, com a atribuição do primeiro lugar no ranking mundial dos Monocle Restaurant Awards.
10 anos, muitos prémios e muitas experiências depois da inauguração do primeiro 100 Maneiras em Lisboa, nascia o novo Restaurante 100 Maneiras, a evolução natural do antigo restaurante situado na mesma rua (entretanto fechado para obras de remodelação).
Foram precisos quatro anos de obras para ver abrir as portas do número 39 na Rua do Teixeira. Um espaço que não é “só” um restaurante, mas que é história de vida: da de Ljubomir Stanisic e de muitas outras, de todas (tantas…!) que cabem, couberam e caberão dentro destas paredes que se forram a pedra e veludo, a ruína e luxo.
O 100 é, antes de mais, parte da história de vida dos proprietários – Ljubomir, Nelson Santos e Nuno Faria – que, com a coragem de poucos, investiram num negócio de uma escala considerável sem rede de apoio, mas também dos outros que pensaram este projecto de vida com eles, como Mónica Franco, mulher do chefe, autora dos seus livros e directora criativa do grupo. Como Manuel Maldonado, chefe executivo do grupo 100 Maneiras, e Miguel Santos, director de operações.
O 100 é feito de carne e osso… De gente como Hugo Marques Amaro e João Miguel Esteves, a dupla de arquitectos da HAJE que ajudou o projecto nascer, o desenhou e o adaptou. Gente como Nini Andrade Silva, a designer de interiores madeirense que levou as ideias à letra e o conceito a cada centímetro da decoração, juntando o sentimento de “Decadentismo” ao Fantástico, e a colocou num lugar onde o sonho se transforma em matéria do real. Pessoas como Gil Correia, André Sentieiro e outros elementos da agência criativa Partners, que leram pensamentos e criaram a nova identidade gráfica, juntando singularidade e ironia, contemporaneidade e natureza. Com traço de génio(s). Ou como Mário Matos Ribeiro, fundador da ModaLisboa e professor de Moda na Universidade, que pensou as fardas em linhos orgânicos, ao mesmo tempo minimais e multiculturais, dispensando palavras para as explicar.
Com o 100, Ljubomir presta uma declaração de amor à sua cidade, uma declaração de paz, o an-siado enterro das armas, a homenagem às suas raízes (não sendo por acaso que a porta se abre para uma enorme raiz que “cai” do tecto). No 100, materializou-se a pacificação – da criança que foi obrigada a viver a guerra, do jovem que se fez cozinheiro porque teve de fugir a ela, do jugos-lavo que adoptou Portugal e se tornou adoptado por ele, do cozinheiro que cresceu na luta e agora se expressa sem medos, ele todo, na paz, no prato.
“Bem-vindos à Bósnia!”, saúda-se todas as noites neste restaurante de 32 lugares no Bairro Alto. O pão da mãe Rosa faz-se acompanhar de especialidades jugoslavas para picar, em loiça comprada numa viagem a Sarajevo. E funciona como carta de intenções. Primeiro conhecemos onde tudo (ele, o chefe patrón) nasceu, depois vemos como ele cresceu, por onde viajou, o que o marcou. É uma viagem pel’ “A História”, o principal menu degustação disponível, com 17 momentos, a que se juntam também “O Conto” (versão mais curta do mesmo menu) e ainda “Ecos do 100”, um menu degustação inteiramente vegetariano, sendo a sustentabilidade cada vez mais um dos pilares da filosofia do grupo (detentor de uma máquina de compostagem que transforma o lixo orgânico dos restaurantes do grupo em fertilizante para a agricultura). Para cada menu, é desenhada uma harmonização de bebidas – vinhos e não só, ainda que os vinhos sejam de facto um dos fortes da casa, com mais de 500 referências. Criada por Nuno Faria, Miguel Santos e a equipa de escanções residentes, a carta de vinhos é um reflexo da vontade de viajar à mesa, de descobrir raridades, de brindar aos pequenos grandes prazeres da vida, e pode ser consultada na íntegra ou através da carta alternativa com uma selecção de 100 vinhos agrupados em secções pouco convencionais, como “Este país também é para velhos”, “Magníficos vinhos do Atlântico” ou ainda “Não morrer antes de beber” – esta última, uma escolha assinada pelo grande (produtor e amigo) Dirk Niepoort.
Em cada mesa, em cada canto do restaurante, nada é por acaso. A loiça exclusiva (parte dela desenhada pelo próprio Ljubomir), os copos de cristal, feitos à mão, os talheres personalizados, a música seleccionada por Nelson Santos, as plantas que forram as paredes da Estufa, a luz que se adapta e evolui consoante o momento, e mesmo o som ambiente nas casas-de-banho com discursos políticos, declamação de poesia, o som dos cauteleiros de Lisboa, os sinos das mesquitas de Sarajevo ou até gravações da missão Apollo 11.
O 100 Maneiras está aberto todos os dias (excepto nos dias de encerramento obrigatório decretados pelo Governo e nos dias 24 e 25 de Dezembro), para jantar, a partir das 19h. As reservas podem ser feitas aqui.