De volta ao Bistro
As portas do Bistro reabriram dia 12.03.2022.
Foram cinco longos meses de obras, de mudanças, de nova vida a ser insuflada em cada canto desta casa. É o renascimento deste que se tornou um clássico da restauração em Lisboa, inaugurado em 2010 num edifício com muitas, muitas décadas de história. Foi uma pausa para percebermos a falta que este Bistro nos faz. E para nos reencontrarmos, iguais apenas a nós mesmos, no lugar de sempre, com a alma de sempre, de cara e espírito renovados. Com o coração do Bistro a bater, novamente, em sintonia com a cidade. Somos um, outra vez. Somos 100 e isso – não importa quantas pedras se partam, quantas luzes se mudem ou paredes se troquem – nunca mudará.
A premissa era simples: dar ao Bistro um muito merecido “lifting” e reformular também os menus de comida e bar.
Inaugurado em Setembro de 2010, no edifício Art Déco que em tempos serviu de casa a restaurantes como o Tavares Pobre ou o Bachus, o Bistro 100 Maneiras é o mais antigo restaurante do grupo liderado pelo chefe “tugoslavo” Ljubomir Stanisic. O que conquistou o título de número 1 mundial nos Monocle Restaurant Awards, em 2017. O que foi escolhido pelo saudoso Anthony Bourdain para integrar o episódio de “No Reservations” dedicado a Lisboa, em 2011. O que ganhou prémios de coquetelaria graças ao bar cheio de curvas e contracurvas, cartão de visita incontornável desta casa. O que acolheu eventos vínicos, ciclos de cinema, leilões de arte, festivais de trufa, festas jugoslavas, anos de risos, lágrimas, explosões, bebedeiras, amizades, zangas, amores e perdas.
É nestas paredes que se escreve muito do que foram os últimos 12 anos das nossas vidas. O melhor e o pior deles. E foi estas paredes que quisemos homenagear, resgatando-as ao tempo, dando-lhes o cuidado, atenção e carinho que 12 anos de trabalho merecem.
Então, partimo-las. Com carinho, claro. Paredes, tectos, rodapés – tudo deitado abaixo. Para permitir ao Bistro renascer, como fénix, não das cinzas, mas do caos absoluto em que se converteu durante cinco meses.
UM CORAÇÃO QUE CONTINUA A BATER, TRANSFORMADO
Nenhuma pedra ficou por virar. Na cozinha, para além do espaço transformado, também os equipamentos foram substituídos, com apoio da Fagor e Loja dos Cozinheiros. Já nas salas, as maiores transformações ficaram a cargo de Mário Belém, artista-quase-residente do Bistro, cujo histórico de colaborações com o grupo e o chefe Ljubomir não pode ser contado pelos dedos de duas mãos, e Rebeca Perez, designer de interiores do Tabula Rasa Design Studio.
Aos 12 anos, foi a maturidade do Bistro, o seu carácter de clássico que não perde a irreverência, a excentricidade e a capacidade de surpreender, que se quis sublinhar. “Acho que estamos a crescer, a amadurecer. Mantemos o tom brincalhão que sempre tivemos, mas de uma forma menos massiva, mais sóbria, mais adulta, elegante e sofisticada”, explica Mário Belém.
“Arrebenta Coração”, o enorme coração desenhado sobre livros e perfurado por cutelos reais que foi imagem de marca do Bistro desde 2015 – e, provavelmente, a fotografia mais partilhada em redes sociais por aqueles que o visitavam – é o exemplo perfeito desse crescimento. E o único pedido feito pelo grupo a Mário Belém: que não desaparecesse por completo. No lugar dele, surgiu então um novo coração 3D, em pinho nórdico e iluminado por leds, para o qual confluem gigantescas facas e cutelos em madeira, que atravessam o tecto até ao bar, substituindo os livros que cobriam as paredes até então.
Novo, também, é o balcão que acompanha as estantes laterais, onde várias caixas de luz em pinho replicam a ideia da “biblioteca do avô”, uma amálgama de experiências e histórias onde não faltam referências à vida de Ljubomir Stanisic, como uma imagem do chefe a nadar entre atuns, outra em que surge acompanhado de uma trouxa, fugindo à guerra e, claro, elementos mais sensuais que não podiam faltar para ilustrar o universo do jugoslavo-feito-português. “Quis traduzir um bocado qual é o raciocínio por detrás de quando tens uma ideia para fazer um prato. Quando vais buscar essas referências que foste coleccionando ao longo da vida e misturas tudo, coisas completamente incongruentes, e às tantas traduzes aquilo num prato e o resultado é assim uma misturada de sensações e emoções. Daqui parte a ligação ao coração, que também surge para simbolizar as melhores ideias, que são sempre aquelas que vêm do coração”, resume Belém.
Já na sala junto à cozinha, são as cerca de 800 lâmpadas pendentes do tecto que mais chamam a atenção. Quando a designer Rebeca Pérez pensou na ideia, a estimativa era de que seriam 240 lâmpadas, mas a obra aparentemente simples tornou-se tudo menos isso…
Ao eterno sofá verde Chesterfield da entrada e ao latão dourado que contorna o balcão do bar foram-se buscar aquelas que são as cores do Bistro e pontuam todo o espaço, seja nos estofos criados por Rebeca ou no tecto do primeiro andar, aquele que, segundo a designer, foi o maior desafio de todos. “Foi bastante complicado porque o tecto é tão baixo que não conseguíamos usar nenhum tipo de luz pendente. Queríamos iluminar e ampliar o espaço sem recorrer a espelhos, porque já era essa a solução anterior. Tentámos três soluções diferentes mas a estrutura do tecto estava muito danificada, era impossível fixar peças pesadas… Então decidi deixar de lutar contra as imperfeições e aceitá-las, seguindo um pouco a filosofia japonesa do wabi-sabi. Redescobrimos a estrutura original, recuperámo-la e quisemos expô-la. Lembrei-me do oculus na cúpula do Panteão romano, um enorme buraco por onde passa a luz, e reproduzimos isso mesmo – um anel em folha de latão que reflete a luz, iluminando todo o espaço sem provocar constrangimentos à passagem e ao movimento”.
CONQUISTAR LISBOA PELO ESTÔMAGO, OUTRA VEZ
Para além das mudanças nos interiores, também os menus foram reinventados pela equipa liderada pelo chefe executivo Manuel Maldonado, numa espécie de homenagem à cozinha clássica que mantém o espírito audaz do 100 Maneiras bem presente. Até porque a sorte favorece os audazes, dizem, e depois de cinco meses de obras, depois de uma pandemia, e passando por uma guerra… toda a sorte é bem-vinda. Mantendo alguns clássicos que são parte da identidade do Bistro, como o Burek jugoslavo de queijo e espinafres, o Polvo picante com mel ou a Espuma de queijo e goiaba, a maior diferença reside em dois factos:
- uma carta diária, com produtos da época, proteínas do dia prontas a viajar para a grelha e o regresso da secção “Só para Corajosos”, com miudezas, entranhas e outras propostas pouco convencionais;
- e uma carta fixa onde, para além das sugestões de entradas, os clássicos (os chamados Top 100) e sobremesas, há diferentes acompanhamentos, organizados por categorias, para serem combinados (ou não) como se desejar com as diferentes propostas diárias. Arrozes, batatas, legumes e molhos que podem ser pedidos para brilhar a solo ou para partilhar a atenção com as diferentes proteínas disponíveis.
Se a cozinha traz novidades várias, o Bar do Bistro não ficou atrás. A nova carta criada por João Sancheira, chefe de bar do grupo, eleito Bartender do Ano 2021 na competição World Class, é composta por 12 cocktails que procuram reflectir a essência do Bistro através de ingredientes naturais, com o imaginário de Alice no País das Maravilhas a servir de mote à viagem e as ilustrações de Tiago Maya a guiar cada passo do caminho. São cocktails que se assumem como personagens principais deste universo paralelo em estado líquido, como o Abóbora Sábia, à base de Monkey Shoulder, sálvia, abóbora, maracujá e especiarias; o Rainha de Copas, com Hendrick’s Orbium, Noilly Prat, Martini Ambrati, vinagre de sidra, framboesa e melancia; ou o Coco Louco, criado com Brugal Añejo, chá verde “gunpowder”, sésamo preto torrado e coco. Criações que se juntam a uma mão-cheia de cocktails de assinatura que já são parte da identidade do Bistro – como o Red Hot Guava, Hulk ou Damn!!! That’s Good – e clássicos incontornáveis da coquetelaria.
Ainda no capítulo líquido, foram várias as alterações feitas também na carta de vinhos, pensada por Miguel Santos, director de vinhos e de front-office, para marcar uma mudança de direcção. Embora as referências obrigatórias se mantenham presentes, o objectivo foi trazer também ilustres desconhecidos para a nova garrafeira: novos jovens produtores, mais pequenos e que trabalham com quantidades mais reduzidas, mas também vinhos de todo o mundo (sendo que os vinhos internacionais representam cerca de 60% das perto de 350 referências presentes na carta).A ideia é permitir que os clientes do Bistro encontrem, aqui, uma experiência única, surpreendente e impactante – um resumo, afinal, do que é este Bistro.
MUDANÇA QUE SE VÊ E SE SENTE
Mudámos por fora, mudámos por dentro. E a mudança aconteceu também ao nível mais elementar de quem somos – a nossa identidade.
Depois de 12 anos, o velhinho logo do Bistro 100 Maneiras (assinado por Mário Belém) foi reformulado para reflectir a maturidade e a história desta casa mas também para sublinhar a diferença entre este espaço e o Restaurante 100 Maneiras, no Bairro Alto – uma confusão comum e que não poucas vezes acabou com clientes a dirigirem-se ao restaurante errado.
“Inspirámo-nos um bocadinho no espaço, nas linhas Art Déco, que estão não só na fachada como no próprio interior, nos materiais, e sentimos que fazia sentido trazer isso para dentro do conceito do logo e toda a linha gráfica”, explica Gil Correia, director criativo da Partners, que lançou internamente o desafio de criação de uma nova imagem para o Bistro. Entre as dezenas de propostas, foi a de Lopo Carvalho a escolhida: um logo que remete não só para a essência Art Déco do espaço como também para os loucos anos 20, “que vão muito ao encontro do que se passa dentro do Bistro”, e que encontra materialização nas mesmas cores e materiais do interior – verde e dourado. A mudança estendeu-se também aos menus, com impressão em latão, e a diferentes elementos que pontuam o espaço, como olhos, pássaros, facas e caveiras, que encontram inspiração não só no período Art Déco mas no universo do Bistro e do chefe Ljubomir Stanisic.
À mesa, sentam-se velhos e novos amigos, num encontro entre as peças Le Creuset, que fazem parte do serviço do Bistro praticamente desde o início, e as louças criadas através de processos de raiz artesanal pela marca Maria – Portugal Terracota, da empresa Villacer, encabeçada por um velho amigo, Paulo Soares.
Diferentes, também, ficaram as fardas da equipa, concebidas pela portuguesa wetheknot, marca de roupa e acessórios sustentáveis criada em 2010 pelos designers Sérgio Gameiro e Filipe Cardigos, focando-se numa gama de peças minimalistas criadas com matérias-primas sustentáveis e de elevada qualidade, para uma maior durabilidade e um menor impacto no planeta.
Tudo isto embalado pelo som da nova playlist organizada por Nuno Faria, sócio e director de F&B do grupo, composta por clássicos “à nossa maneira”, vindos de todas as partes do mundo – Portugal e Bósnia incluídos, claro está.
O novo Bistro funciona no mesmo horário: de quinta a segunda, das 18h30 às 02h, e sábados e domingos das 12h às 15h e das 18h30 às 02h.
As reservas podem ser feitas por telefone (+351 910 307 575), email (info@100maneiras.com) ou online em www.100maneiras.com.